Image Map

quarta-feira, 19 de junho de 2024

Presidente do CSA abre o jogo sobre 'covardia', orçamento e comparação com Leila, do Palmeiras



O plano de reformulação do CSA tem ocupado as semanas de Mírian Monte. Empossada como presidente do Marujo em março deste ano, assumindo o cargo deixado por Rafael Tenório, a mandatária assumiu o clube em um momento delicado e segue à frente de uma grande reestruturação, principalmente na pasta de futebol. 

Em entrevista ao Nossa Resenha, do canal de televisão Nosso Futebol, a dirigente abriu o jogo sobre os atos dos primeiros três meses de gestão, detalhou a situação financeira do clube e falou sobre a pressão sofrida desde então.

A pasta de futebol sofre com reformulações desde o final do Campeonato Alagoano, quando o CSA não conseguiu sequer passar da fase de grupos. O péssimo desempenho na Série C, sem nenhuma vitória em nove jogos, fez com que mais uma barca fosse anunciada pelo clube. Entre as saídas, quatro jogadores que vinham atuando no time titular e o auxiliar técnico Bebeto Moraes.

Mirían Monte revelou a atual configuração da pasta, incluindo a saída de Marquinhos Mossoró da Coordenação de Futebol. Veja abaixo:

  • Executivo de Futebol: Carlos Bonatelli;
  • Gerente de Futebol: Luciano Lessa;
  • Coordenador Técnico: Marquinhos Mossoró;
  • Coordenador de Futebol: Jadson Oliveira; e
  • Técnico: Higo Magalhães.

A mandatária pincelou sobre o plano de reformulação e contou que não participava das decisões finais quando ainda era vice-presidente. 

“Eu procuro confiar bastante na diretoria executiva. Então, no início do ano, não estava realmente participando. Mas a partir de março, precisei abraçar o clube, que encontrava, na diretoria de futebol, Rodrigo Pastana. Naquele momento, Rodrigo mostrou o planejamento dele e entendeu pela necessidade de uma reformulação de parte do elenco e a manutenção de uma espinha dorsal composta por atletas mais experientes e com mais vivência em clubes de massa.” (Mírian Monte)

A comunicação com o departamento de futebol também foi citada, ressaltando os bônus que o clube já teve desde que ela assumiu. “Eu procuro estimular o diálogo entre todo o departamento. Nós, nesse momento intenso, já vivemos altos e baixos, conseguimos a Copa Alagoas, o acesso à Copa do Brasil [2025] e garantimos calendário importante para o ano que vem. Todo departamento mantém diálogo constante e estão trazendo e estudando as melhores estratégias para que a gente consiga superar essa primeira fase do campeonato, que não trouxe os resultados que a torcida merece e que nós desejamos para o Centro Sportivo Alagoano."

“Torcida não admite covardia” e pitaco nas contratações

Outro ponto citado pela dirigente foi a pressão que é assumir o CSA. Inclusive, essa é uma preocupação da pasta de futebol, que procurou definir perfis de jogadores para evitar que atletas mais jovens sejam queimados por não aguentarem a pressão que o clube enfrenta.

“É importante que você conheça a cultura de cada local e de cada clube. E nessa interação, até pela minha vivência em arquibancada, eu dou minha contribuição para que a gente busque perfis de jogadores que venham para cá e que consigam encarar e vestir uma camisa que é muito pesada. O CSA, nos seus piores momentos, lota o Rei Pelé. A torcida do CSA não admite covardia, a torcida não admite que o jogador se esconda em campo. E quando a torcida percebe isso, ela cobra. E muitas vezes isso não é assimilado pelo atleta. Neste momento, a gente precisa compreender o contexto cultural do que é jogar no CSA. E isso eu tenho, essa troca procuro fazer. Quando eles trazem as opções, eu pesquiso, eu converso, a gente busca informações com desempenho e vivências. A gente tem percebido que, às vezes, um jogador muito jovem sente a pressão desse momento do CSA, nem sempre ele consegue obter o seu melhor desempenho. Então é essencial que a gente equilibre esse plantel com jogadores experientes, tem que manter o perfil sanguíneo que vai buscar [por coisas maiores], que ainda tem objetivos, metas e sonhos. Talvez seja o formato ideal. Agora fazer isso com a coisa acontecendo não é simples.” (Mírian Monte)

Diferença do modelo de gestão anterior e orçamento

Não é de hoje que o CSA passa por uma situação complicada em relação aos cofres. Em julho do ano passado, o clube entrou em recuperação judicial, com uma dívida avaliada, à época, em R$ 20 milhões (entenda aqui). Com a saída de Rafael Tenório da presidência, que assumia a parte financeira do clube, Mírian revelou como o planejamento foi refeito.

“O clube tinha um formato de gestão que centralizava toda a sua potência, toda a sua administração, na figura de um presidente [Rafael Tenório], que reconhecidamente é um empréstimo muito rico. Então, isso trouxe também uma acomodação de maneira geral. O clube, por exemplo, se apoia essencialmente em recursos públicos, patrocínios públicos, emendas parlamentares, patrocínios do governo. A parte comercial do clube ficou adormecida por um bom tempo. Então, neste momento que o clube rompe com esse modelo de gestão centralizada e passa a adotar o compartilhamento de responsabilidades, hoje a gente tem um grupo político forte, com potencial de abertura comercial amplo. No entanto, nós temos sim previsão orçamentária, mas neste momento precisamos contar com o orçamento público.” (Mírian Monte)

Cortes foram feitos em quase todos os setores do CSA para enxugar a folha salarial. “Vamos aplicar a gestão fincada em princípios como o da economicidade, razoabilidade e proporcionalidade. Nós, de março para cá, estamos tentando enxugar despesas, os excessos, mantendo a menor máquina possível, claro, sem prejudicar a estrutura necessária para o futebol profissional. Então, até hoje, não faltou absolutamente nada. O futebol profissional não teve nenhum tipo de problema de ordem estrutural. Porém, os resultados esportivos não estão chegando e também não chegam, acredito, que muito se deve a essa série de mudanças que aconteceram. Imagina o que é passar por três executivos, quatro técnicos - cada um com uma forma de pensar o jogo, de se comportar.  Então tudo isso para ser assimilado necessariamente termina se refletindo no desempenho em campo. Mas o caminho é buscar essa estabilidade institucional. Administrativamente estamos conseguindo nos organizar, fortalecendo setores como jurídico, contábil, e tudo isso vai dar uma estrutura para que o futebol consiga melhores desempenhos." (Mírian Monte)

Chamado “para apagar incêndio” e pressão por ser mulher

Mírian aproveitou para levantar a pauta do feminismo e sobre os questionamentos que recebe “pelo fato de ser mulher”. 

“Eu acredito que nós [mulheres] somos muito mais cobradas e muito questionadas. Eu, por exemplo, sou o tempo inteiro questionada: ‘Ah, ela não sabe nada de futebol, nunca jogou futebol’. Os outros presidentes também, até pelos perfis. São gestores, não me recordo de nenhum atleta. Mas eles não são cobrados da mesma medida. É uma questão cultural. Antes de assumir a presidência, eu estava muitas vezes afastada e só era acionada quando era necessário pacificar, mediar, tentar apagar um incêndio. Isso foi algo constante nos últimos três anos. E talvez, o fato de ser mulher fizesse com que eles me buscassem nesses momentos de crise. E isso também é algo cultural. Nós mulheres somos destinadas a nos doar e olhar o outro, é muito intuitivo nesse papel do zelo, do cuidado e proteção. Talvez esse instinto de proteção é o que me faça estar aqui neste momento tentando fazer com que o CSA volte a se organizar, a ter êxito esportivo e a ter um cenário de estabilidade e de paz, porque sem um cenário pacificado não se consegue desenvolver muita coisa." (Mírian Monte)

Comparação com Leila e relação com Rainha Marta

Um dos principais nomes do futebol nacional nos últimos anos é o de Leila Pereira, presidente do Palmeiras e que acumula oito títulos à frente do Verdão. O papel da mandatária é visto como referência para Mírian Monte.

“A Leila é uma referência, não apenas para as mulheres, mas também para os homens. O papel dela é tão importante na história do futebol brasileiro, mundial, e na história da luta feminina. Ela faz de forma muito intuitiva. E quando ela quebra paradigmas, quando ela mostra, principalmente para os homens, a grande gestora e a capacidade que ela tem de superar obstáculos e alcançar títulos, ela começa a mudar uma chave dentro da sociedade como um todo. Então, a Leia é uma das mulheres mais importantes do século. No entanto, em termos de estrutura, de recursos, de divisão, de realidade dentro do futebol, nós talvez tenhamos um abismo que nos separem, mas nós temos muitas identificações por sermos mulheres. A cobrança que ela sente, embora tenha o avião, embora tenha sete títulos, eu tenho certeza que, em muitos momentos, ela sente o que eu sinto. Dentre as séries A e D, só somos eu e Leia à frente de um clube de massa. [Aqui] além de ser mulher, tem o fato de ser nordestina. São duas cargas culturais e sociais pesadas e que a gente precisa ter resiliência e compreensão para poder suportar. Mas eu vou dizer: eu me inspiro em mulheres fortes na cultura, nos esportes, no direito. A Leila é uma mulher que me inspira e eu tenho certeza que ela vai continuar inspirando muitas outras mulheres.” (Mírian Monte)

Outra mulher citada por Mírian foi a alagoana Marta, azulina de carteirinha e vencedora de seis Bolas de Ouro. 

“Marta é alagoana de Dois Riachos e torcedora do CSA. Isso ela nunca escondeu de ninguém. Os dias têm sido tão corridos que realmente não consegui ainda buscar esse contato [com ela], buscar essa força, a referência na Marta, mas eu tenho certeza que esse momento vai acontecer. A gente vai conseguir respirar! Marta também é um orgulho da nossa terra, orgulho para a luta feminina, e ela é uma genuína, uma rainha. A nossa rainha é azulina.” (Mírian Monte)

Por que não deu certo após a chegada na Série A em 2019?

Comparações com aquele CSA que empilhou acessos ano após ano até alcançar a elite do futebol nacional acontecem com frequência. Para Mírian, a grande diferença para aquele time que conseguiu ser campeão da Série C em 2017 diante do Fortaleza é a falta de união nos bastidores recentes.

“O que está faltando no CSA é o que aquele elenco tinha. É aplicar o nosso lema do clube: ‘União e Força’. Eles eram muito unidos. Eles tinham um propósito: uma espinha dorsal que saiu da D para C, da C para B, e da B para A. Quando essa espinha foi desfeita, [o lema] acabou. Quando o sucesso chegou à cabeça e se esqueceu quem foi que levou à trajetória, acabou. Então, quando a gente não colocar em prática o lema, a gente não vai conseguir.”

“Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo”

A falta de resultados incomoda a torcida e a própria direção. “Em relação ao desempenho, esse já é o segundo ano consecutivo, que embora haja o investimento, embora haja a contratações de grandes profissionais, desde diretores executivos a jogadores renomados, o CSA não vem conseguindo um bom desempenho esportivo. Isso ninguém vai tapar o sol com a peneira. Então, o futebol realmente não é uma ciência exata. O CSA, com um plantel que teve em 2024, não justifica o desempenho que vem tendo. É preciso realmente buscar formas para corrigir, tem que enfrentar a realidade. E aí, essas correções precisam ser realizadas com mão forte", disse.

Apesar do baixo desempenho dentro das quatro linhas, Mírian ressaltou o trabalho que está sendo feito e se considera “realista esperançosa” com o futuro do clube.

“Em tempo recorde, nós conseguimos grandes avanços fora de campo. Em tempo recorde nós conseguimos construir uma diretoria formada por pessoas responsáveis e que estão decididas a tentar reerguer e organizar essa casa. Essa, para mim, é o primeiro passo para a pacificação. O segundo passo foi tentar realmente um modelo de gestão de distribuição de responsabilidade e cada um assumindo a sua parte. [Também] fazer uma gestão de economia, responsabilidade e consciência. Essa é outra grande conquista, é um passo nessa organização ideal. Agora, em relação ao futebol, isso aí a gente ainda está no processo de organização. Os reflexos disso vão ser vistos, mas nem sempre no prazo que a dinâmica do futebol exige. Tem até uma frase que diz: ‘Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo’. Acho que ela explica bem essa situação do clube, mas grandes avanços fora de campo eu já consegui enxergar. Agora é trabalhar. A gente sabe que o que você semeia, você vai colher. Às vezes, o tempo de colheita não é o que você deseja, mas você vai colher. Então, essa organização, essa redução dos excessos, essa consciência das responsabilidades, de entender que o CSA é mais que um clube de futebol, essa assimilação precisa ser ampla. Eu faço uma projeção otimista, realista. Eu acho que eu me defino como Ariano [Suassuna]: eu sou uma realista esperançosa.  (Mírian Monte)

NM com Gabriel Amorim 

Foto: Augusto Oliveira  

Nenhum comentário:

Postar um comentário