Morreu nesta quinta-feira o ex-atacante Alcides Gigghia. Foi dele o gol da vitória por 2 a 1 do Uruguai sobre o Brasil na Copa do Mundo de 1950, na partida que ficou conhecida como Maracanazo. Ele sofreu um ataque cardíaco e não resistiu. Tinha 88 anos, e era o último jogador vivo de uma das maiores partidas da história do futebol.
Coincidentemente, a morte de Gigghia ocorre exatamente no 65º aniversário daquele jogo, disputado também em um 16 de julho, no Maracanã lotado por 199.854 torcedores. O então jogador do Peñarol marcou o gol da virada celeste, aproveitando a famosa falha do goleiro Barbosa, que não defendeu seu chute no canto esquerdo.
Gigghia tinha saúde estável, mas que ficou debilitada depois de um acidente de carro, em 2012, que o deixou no hospital em estado grave. No entanto, ele sempre comparecia a eventos importantes em que era convidado, como o sorteio dos grupos da última Copa do Mundo, que aconteceu em 2013, na Costa do Sauípe, na Bahia.
Dono da medalha de Ordem de Mérito da Fifa, a lenda do Uruguai foi homenageada em 2009, colocando os pés na Calçada da Fama do Maracanã. Ele foi apenas o sexto jogador estrangeiro na história a ter essa honraria, após o chileno Elías Figueroa, o paraguio Romerito, o alemão Beckenbauer, o português Eusébio e o sérvio Petković.
Agradecido, emocionou-se e chorou.
"Nunca pensei que seria homenageado no Maracanã, estou muito emocionado. Meus sinceros agradecimentos ao público. Agradeço profundamente. Viva o Brasil!".
GETTY IMAGES
Quem foi Alcides Ghiggia
Nascido na capital uruguaia em 22 de dezembro de 1926, Ghiggia começou a carreira de jogador aos 20 anos, no Atlante. No ano seguinte, passou a defender o Sud América, modesto clube de Montevidéu que circulava entre a elite a segunda do país.
Em 1948, apenas dois anos antes do Mundial do Brasil, Ghiggia chegou ao Peñarol. O clube foi campeão nacional em 1949 de forma invicta. Além daquele jovem ponta-direita, a equipe tinha o ótimo goleiro Máspoli, o aguerrido centromédio Obdulio Varella e um ataque mortal, com Schiaffino, Míguez e Vidal.
O grande time do Peñarol acabou se tornando a base da seleção uruguaia que viajou para o Brasil em busca do bicampeonato mundial. E Ghiggia, o menos famoso daquela linha de ataque antes da Copa, acabou tornando-se uma das estrelas do time.
EFE
O ágil ponta-direita ganhou espaço ao longo da competição. Com a desistência da França, o Uruguai teve apenas a Bolívia como adversária na primeira fase. Na goleada por 8 a 0, o destaque foi Míguez, com três gols; Ghiggia marcou o último, aos 38 do segundo tempo.
Na fase final, o ponta voltou a marcar. Foi dele o gol que abriu o placar contra a Espanha, em duelo que terminou empatado por 2 a 2. Quatro dias depois, Ghiggia marcou o primeiro da vitória por 3 a 2 sobre a Suécia.
Quando os uruguaios chegaram à última rodada do quadrangular final, contra o Brasil, no Maracanã, Ghiggia já era um nome conhecido. Afinal, ele era o único jogador uruguaio que havia feito gols em todas as partidas.
Na "decisão" do Mundial, os brasileiros entraram na decisão como franco-favoritos. Com melhor campanha na fase final, a seleção jogava por um empate; uma vantagem que, aliada à euforia da torcida, criava um clima de vitória anunciada em todo o país.
Um clima que contagiou, também, as milhares de pessoas que lotaram o Maracanã. Não há registros precisos do público daquela partida. A Fifa adota 173.850 como número oficial. Mas há quem diga que eram 190, 200 mil pessoas nas arquibancadas.
Uma multidão que fez festa durante 79 minutos de jogo. Um país inteiro que vibrou no gol de Friaça, aos 2 minutos da segunda etapa, e que pouco se preocupou quando, aos 21, Schiaffino faz 1 a 1. Um povo que esperou, segundo após segundo, pelo primeiro título mundial. Mas, no meio do caminho, havia Alcides Ghiggia.
A cena não sai da cabeça dos brasileiros. O ponta recebe a bola pela direita, avança e chuta cruzado, quase sem ângulo. A bola não sai forte, mas quica no gramado e passa entre o goleiro Barbosa e a trave esquerda.
ARQUIVO
O gol foi o segundo do Uruguai e selou a derrota por 2 a 1, a maior tragédia do futebol brasileiro em todos os tempos (até o 7 a 1 de 2014...). Foi, também, o quarto de Ghiggia em quatro jogos naquele Mundial. Curiosamente, o ponta jamais voltou a marcar pela equipe celeste. Foram ao todo 12 partidas e aqueles quatro gols, todos marcados na Copa.
Depois de se tornar herói nacional, Ghiggia ainda ficou no Peñarol por três anos. Em 1953, foi contratado pela Roma, onde ficou até 1961. Em 1957, o ponta-direita defendeu também a seleção italiana.
Ghiggia poderia ter disputado outras duas Copas do Mundo. Mas quis o destino que o Mundial de 1950 fosse o único do carrasco brasileiro - em 1954, a Roma não liberou o ponta-direita para jogar pelo Uruguai; quatro anos depois, quando defendia a Itália, ele viu a equipe ficar fora da Copa do Mundo na Suécia.
De volta a Uruguai, Ghiggia ainda defendeu o Danúbio, antes de se aposentar. O herói nacional passou a trabalhar como funcionário de um cassino em Montevidéu ao lado de Obdúlio Varela, companheiro de Peñarol e de seleção uruguaia. Ali, aposentou-se pela segunda vez, garantindo condições financeiras de se manter até o fim da vida.
Em 2009, Ghiggia, já com problemas de saúde e dificuldades de locomoção, voltou ao Maracanã para receber a maior homenagem da carreira. O uruguaio foi o centésimo jogador a colocar os pés na Calçada da Fama do estádio que havia calado 59 anos antes.
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